"Exército" da Universal preocupa religiões afro-brasileiras
Vídeo de jovens fardados, batendo continência e "prontos para batalha" causa temor de violência religiosa. Para analistas, Gladiadores do Altar é sobretudo uma arma para atrair jovens
Por Deutsche Welle
Num vídeo de grande repercussão na internet, jovens vestidos com uma farda semelhante às usadas por militares marcham, batem continência, gritam palavras de ordem e se dizem prontos para a batalha. Só que as imagens não são de um treinamento do Exército, mas do grupo Gladiadores do Altar, criado pela Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) com a declarada intenção de atrair novos pastores.
As religiões afro-brasileiras, um dos principais alvos da intolerância religiosa no Brasil, mostraram-se preocupadas com o que viram e pediram a abertura de investigações ao Ministério Público Federal. Mas, segundo especialistas, a criação do Gladiadores do Altar visa sobretudo chamar a atenção para a Universal, que perde fiéis em meio a uma acirrada disputa no "mercado" das religiões.
"A criação do grupo é uma forma de atrair jovens, principalmente da periferia, para engajá-los e inseri-los na igreja, oferecendo-lhes uma mobilização militarizada", afirma o professor de ciências da religião Leonildo Silveira Campos, da Universidade Mackenzie. "Acho que é mais um golpe de marketing da IURD para se manter dentro da mídia, criando fatos inusitados."
Ele cita, como exemplos, o caso do pastor que deu um chute numa estátua de Nossa Senhora de Aparecida em 1995; a inauguração do megatemplo de Salomão, em São Paulo; e, agora, a criação do Gladiadores do Altar.
O professor de sociologia da religião Edin Abumanssur, da PUC-SP, também vê na fundação do Gladiadores uma tentativa da Universal de melhor sua posição no mercado de religiões no Brasil, no qual a disputa é cada vez mais acirrada. "As religiões pentecostais têm crescido num ritmo menos acentuado do que na década passada. Isso pode ser uma resposta à perda de fiéis."
Na década passada, o segmento religioso dos evangélicos foi o que mais cresceu, passando de 15,4% da população para 22,2%, segundo o IBGE. Isso equivale a um aumento de 16 milhões no número de adeptos, que chegou a 42,3 milhões em todo o país. Só que, mesmo com esse enorme aumento, a Universal encolheu, perdendo 229 mil fiéis entre 2000 e 2010. A igreja fundada pelo bispo Edir Macedo é a terceira entre as evangélicas pentecostais, atrás da Assembleia de Deus, com 12,3 milhões de fiéis, e da Congregação Cristã do Brasil, com 2,2 milhões. A Universal tem 1,87 milhão.
Para conter a saída de fiéis, a Universal tem feitos grandes investimentos na compra de horários em redes de televisão, numa tentativa de tirar espaço do pastor Valdemiro Santiago, o líder da Igreja Mundial do Poder de Deus. Fundada em 1990 por Santiago, depois de ele deixar a Universal, a Igreja Mundial do Poder de Deus apareceu pela primeira vez na lista de igrejas de IBGE em 2010, com 315 mil seguidores. Boa parte deles é oriunda da Universal.
Temor de intolerância religiosa
As religiões afro-brasileiras temem, porém, que o Gladiadores do Altar possa resultar num aumento dos casos de intolerância religiosa no país. Esse temor se fundamenta na aparência de milícia paramilitar que o vídeo difundido na internet transmite. Em 23 de março, representantes do candomblé e da umbanda entregaram ao Ministério Público Federal, em 26 estados, um pedido de abertura de inquérito civil para investigar possíveis casos de intolerância religiosa. A ação, segundo as lideranças do movimento, em entrevista ao jornal O Globo, é uma reação ao Gladiadores do Altar.
"Fizemos esse ato como uma reação. A criação do grupo Gladiadores do Altar, que parece até uma milícia, ganha uma relevância maior dentro de um contexto de perseguição. O discurso de fundo da Universal é intolerante", afirmou Márcio Alexandre, coordenador de política institucional do Coletivo de Entidades Negras. Para ele, no cerne da teoria pentecostal está a ideia de uma guerra invisível, na qual cabe às igrejas pentecostais salvar as pessoas do que consideram um mal. "Se a linguagem deles é de guerra, a prática também pode ser", afirmou ao jornal carioca.
O pano de fundo dessa apreensão são atos de intolerância religiosa, principalmente contra as religiões afro-brasileiras, como a Umbanda e o Candomblé. Entre os casos registrados pelo Disque 100, da Secretaria de Direitos Humanos, está a invasão de terreiros em Olinda, onde evangélicos exibindo faixas e gritando palavras de ordem também realizaram um protesto em frente a um terreiro; ou ainda o uso, por uma igreja, de imagens de mães-de-santo, "chamando de feitiçaria e difundindo o ódio pelas redes sociais", segundo denunciantes.
Para o professor de sociologia Gedeon Freire de Alencar, da Faculdade Batista, o Gladiadores do Altar tem um nome ruim e foi lançado num momento inadequado, marcado por conflitos religiosos protagonizados pelo "Estado Islâmico" e pelo Boko Haram. "Há muitas músicas de guerra dentro das igrejas. Há uma questão ideológica e simbólica que as igrejas estão em luta contra o mal, satanás e o pecado. Essa discussão sempre existiu" , comenta. "E qualquer coisa que a Universal fizer será mal vista por outros grupos, mesmo que outras igrejas já tenham feito o mesmo."
O Ministério Público Federal na Bahia (MPF-BA) anunciou que vai instaurar inquérito civil com base na representação contra a intolerância religiosa protocolada por representantes de religiões de matriz africana. De acordo com o MPF-BA, nada impede o MPF-SP de também iniciar investigações, já que a sede da Universal fica em São Paulo.
Por meio de nota, a IURD afirmou que reitera o seu apreço pelos seguidores de todas as religiões e que o projeto Gladiadores do Altar se resume a um programa de ensino religioso totalmente pacífico. Segundo o documento, a "falsa polêmica" é fruto de um lamentável mal-entendido surgido na internet e alimentado pelo "desconhecimento de muitos" e pelo "preconceito de alguns".
"O projeto visa nada mais que a formação de jovens vocacionados para o trabalho pastoral. Não há disciplina militar, não existe atividade física envolvida e jamais houve – nem nunca haverá – incitação à violência ou ódio a qualquer religião", afirma a nota. A Igreja destaca ainda que o Ministério Público do Ceará avaliou que "não vislumbra um movimento armado ou com conotação de milícia no vídeo apresentado" e pediu respeito ao direito constitucional de liberdade de culto e de expressão da Universal.
"A Universal está à disposição das autoridades para prestar quaisquer esclarecimentos sobre o programa e reafirma o respeito aos fiéis de todas as religiões, em cada um dos mais de cem países onde está presente", diz a nota. "Aguardamos igual consideração por nossas crenças e convicções."
4 Comentários
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Boa tarde, senhores (as). Tema interessante. continuar lendo
Alguém me mostre uma lei proibindo praticar ordem unida?
A igreja adventista e os escoteiros praticam há anos! continuar lendo
Boa tarde. Dialoguei com membros desse grupo "perigoso", os "gladiadores do altar" e aqui estão as minhas impressões:
1 - Não é um grupo paramilitar : não possuem armas ou liderança que incite à violência; 2 - Não são violentos : são bastante educados, não obstante originarem-se de classes mais pobres; 3 - Não incitam à violência, apenas convidam a reuniões de oração, principalmente às sextas-feiras,e segundo dizem, nessas reuniões (ou cultos) podem ocorrer manifestações e expulsões de "espíritos malignos" (como descrito na bíblia na parte do testamento); 4 - Não notei sinais de proselitismo ou intolerância em relação à outras religiões, tais como as de cunho africano, dizem respeitar qualquer religião.
Minha opinião é que eles são um grupo organizado, pacífico e destinado a aumentar o número de fiéis dessa igreja. Pode ser que estejam incomodando outras religiões à medida que quebram paradigmas religiosos brasileiros, e conseguem agregar mais pessoas. Procure dialogar com esses caras para tirar suas impressões. Até o momento não vejo necessidade alguma de provocar a Jurisdição, pois como disse muito bem certo sábio: "Se as divindades se sentem ofendidas, que elas mesmas se defendam, e questões de crenças em seres invisíveis não se tornem uma lide". continuar lendo
Sinceramente não sei se essa reportagem é um marketing da Universal ou um blefe. Está na constituição o livre credo, não estamos em um país onde o radicalismo impera. O catolicismo foi implantado no Brasil na época de seu descobrimento, o camdombé surgiu com o advento dos africanos que vieram escravizados para trabalhar no pais..A religião afro tem vários desdobramentose o número deseguidores dessa religião não é pequena, Temos a umbamba, a quimbanda e espiritismo (cujo codificador foi Allan Kardec). Mas essas religiões que têm surgido, a intenção da polêmica e tentar mostrar aos incautos que eles são melhores, poderosos e com isso arregimentar mais pessoas para praticarem sua crença..Tanto que Igrejas pentecostais dissemiram no Brasil num volunme astronômico, sempre protendo uma vida melhor e financeiramente equilibrada.
Não acredito que esses "patrulheiros;" evangélicos estão se preparando para caça aos
adetos do camdomblé, rimeiro até para atacarum grupo social, é necessário estratégias, e povo condicionado, bitolado, nem sabe penar por si próprio.Essa informação não me assusta, tenho é pena de quem se deixa manipular, seja pela imprensa, elos políticos e até por religiões. continuar lendo