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20 de Abril de 2024

O desafio de punir juízes no Brasil

Casos como o do magistrado flagrado dirigindo o Porsche de Eike Batista causam indignação, mas sanção máxima é a aposentadoria compulsória

há 9 anos

Por Deutsche Welle — publicado 25/03/2015 04:41, última modificação 25/03/2015 05:20

O juiz federal Flávio Roberto de Souza, flagrado dirigindo um Porsche apreendido na casa do empresário Eike Batista, está afastado das funções. Teve prisão pedida pelo Ministério Público Federal, mas negada pelo Tribunal Regional Federal do Rio. Em dezembro do ano passado, o magistrado maranhense Marcelo Baldochi foi punido por abuso de poder depois de dar voz de prisão a funcionários da TAM que o impediram de embarcar por atraso.

Mesmo com o afastamento, ambos recebem a aposentadoria compulsória, sanção máxima conferida a membros do Judiciário. Eles continuam recebendo vencimentos integrais ou proporcionais ao tempo de serviço, assim como mais de 40 juízes que, atualmente, estão submetidos a esse regime. No Brasil, um juiz só pode perder o cargo depois que for condenado e a sentença transitar em julgado – ou seja, quando se esgotarem todos os recursos.

"Essa aposentadoria privilegiada causa uma enorme revolta na população. Não é possível alguém cometer um fato grave e se retirar com uma renda muito superior à da maioria absoluta dos brasileiros", afirma o desembargador Vladimir Passos de Freitas, professor da PUC-PR.

Propostas de reforma emperradas

A justificativa usada para a punição com aposentadoria é que os cargos são vitalícios. "Isso dá direito ao recebimento, mas não é republicano. Eles deveriam, se fosse o caso, pagar pelo prejuízo que provocaram. Não podem ser premiados com uma aposentadoria compulsória e recebimento de salários", critica o ex-procurador Lenio Streck.

Duas Propostas de Emenda Constitucional (PECs) tramitam no Congresso para pôr fim à aposentadoria compulsória. A PEC 505, de 2010, está parada na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados. O projeto exclui a aposentadoria e permite a perda de cargo de magistrados e membros do Ministério Público. A PEC 53, de 2007, que também tramita na Câmara, prevê a aposentadoria, mas mantém intactos os vencimentos de autoridades acusadas de irregularidades.

Para Streck, a magistratura se beneficia de legislações atrasadas, que abrandam punições a juízes que cometem irregularidades. Segundo ele, vai levar anos ainda para equiparar a jovem cidadania – "porque a democracia brasileira é recente" – a uma Justiça centenária.

Corporativismo e impunidade

Segundo Freitas, a fiscalização sobre a conduta dos juízes tem melhorado, mas ainda existe muita proteção interna. "Muitas vezes os que aplicam a sanção são conhecidos dos infratores e decidem de forma muito condescendente, impondo, por exemplo, uma mera pena de advertência", explica.

Ele acredita que a reforma da Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman) pode trazer avanços para o controle disciplinar dos juízes. "As próprias associações começam a se dar conta de que não podem proteger os que têm má conduta, porque isso afeta todos indistintamente", diz.

A Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) se posicionou a favor da apuração do caso do juiz que utilizou o automóvel de Eike Batista, rejeitando dar apoio ao magistrado. Para Freitas, essa é uma posição inédita. "Jamais vi uma associação tomar tal tipo de atitude", afirma o ex-presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em Porto Alegre.

Para Streck, casos como o da TAM e o do Porsche mostram que os juízes se consideraram acima dos cidadãos. Freitas lembra que esses casos são exceções. "Mas eles acabam abalando a imagem de toda a classe. Por isso penso que as medidas disciplinares devem ser rápidas e efetivas."

Herança patrimonialista

Para Streck, as leis do Judiciário, Ministério Público e Defensoria Pública são corporativas: "Elas trazem mais direitos do que deveres. Isso faz parte da nossa herança patrimonialista."

O especialista dá um exemplo: entidades de classe querem que a presidente Dilma Rousseff vete artigos do novo Código de Processo Civil, aprovado pelo Congresso, que exigem fundamentação das decisões judiciais. Segundo nota das três associações de magistrados do país (AMB, Ajufe e Anamatra), os vetos não têm o objetivo de "diminuir o trabalho dos juízes", mas preservar a independência funcional e a "duração razoável do processo".

"Quando se trata de maior responsabilização para os juízes, as entidades recuam. O modo como elas lidam com a população ainda é muito autoritário", avalia Streck.

Fonte: http://www.cartacapital.com.br/política/o-desafio-de-punir-juizes-no-brasil-2769.html

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Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/o-desafio-de-punir-juizes-no-brasil/177072379

19 Comentários

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Eu não diria que são casos isolados e raros.Infelizmente, essa norma vigente queautorga super poderes aos juízes, que cria no seio da sociedade brasileira esse tipo de profissional que se julga estar acima do bem e do mal.
O que eu sempre questionei é essa superioridade que abusa do poder constituído.
Além do mais, coisa que não consegui digerir até hoje, é o por quê, os salarios básicos dos tres poderes são tão diferenciados.
Vou exemplificar por experiência, sou servidora nivel universitário do poder executivo, como bem diz o termo, é aquele que executa, que faz acontecer. Somos a categoria que tema menor remuneração. Uma colega da profissão, fez concurso para o judiciário, o salário dela era o dobro do meu por uma jornada de 6 horas,sendo que eu cumpriauma jornada de oito horas diárias.
Agora pensando: se os salários vem de uma mesma fonte, qual a razão do poder executivo ter seus vencimentos abaixo dos outros poderes?
Voltando a questão dos juizes, dentro da minha entidade, existiu um abuso de poder de um juiz, inclusive querendoque a lei de espera fosse aplicada apenas a ele, sendo que naquele serviço existia sala de espera, com ar condicionado e todos eram atendidosde acordo com aordem de chegada, através de uma senha. Esse senhor teve a cara de pau de chamar a polícia para prender uma colega que não erachefe do serviço, apenas tentou explicar o funcionamento daquele prestador de serviços.
Já saiu nas manchetes dos jornais de minha cidade,juizes dando voz de prisão a guardas de trânsito porque estavam no seu legítimo direito de fazer cumprir alei para todos isonomicamente. Afinal, o juiz estacionou seu carro em local proibido e não estava em seu horário de trabalho. Dependendo da independencia do orgão ao qual o servidorpúblico estava ligado, seus superiores acatam esses desmandos de alguns juizes.
Sou também favorável que isso de cargo vitalício acabe, lembro que na minha universidade existia isso nas cadeiras de direito,cargo vitalício, virava herança de pais para filhos para ocupar a vaga de professor.
Num processo democrático, somos todos iguais perante a lei, não importando se sou juiz, professor, faxineiro ou qualquer outra coisa, afinal isso é desmando e somos todos cidadãos brasileiros, portanto as leis não podem ser diferentes de acordo com a formação de cada cidadão. Passou da hora de mudar essas leis arbitrárias que favorecem os infratores e esses estão para defender os interesses da sociedade brasileira.
Oportuna a matéria, apoio a iniciativa e que realmente o assunto deva ser discutido para que não tenhamos profissionais que recebem seus vencimentos através dos impostos que a população paga e não se sente protegida por agentes públicos como esses. continuar lendo

Desculpa a sinceridade, mas vc não falou nada com nada.
Opinar sobre v.g. cargo vitalício sem ao menos conhecer as razões da existência desse instituto é insensatez.
Talvez um estudo mais aprofundado sobre alguns assuntos, além de esclarecer, enriquecerá o debate e, quem sabe, a qualificará, para além de entender sobre os Poderes e Órgãos do Estado, passar no tão cobiçado cargo no Judiciário e assim despedir-se do penoso incompreendido Executivo. continuar lendo

Lalá, assino em baixo do que vc escreveu. Quem se posiciona contra é porque é juiz, parente de juiz ou bajulador de juiz (e não são poucos os bajuladores!). Infelizmente, em nosso Brasil varonil, um juiz pode até não ser Deus, mas deve ser o Espírito Santo. E fazem um lobby fortíssimo pra que tudo permaneça como está, ou seja, que gozem de todas as mordomias e privilégios que atualmente usufruem. É claro que isso é uma distorção, pois não é justo que uns gozem dessas regalias em detrimento de tantos outros cidadãos. É preciso acabar com isso. Para o exercício da autoridade nõ é necessário o exagero. Aliás, o exagero só redunda em humulhação e revolta. Parabéns e abraço! continuar lendo

Obrigada pelo comentário Edson Sampaio, isso que escreveu é uma verdade, e foi dessa forma que eu entendi a colocação até grotesca do sr. caio rios.Sempre lutei por direitos e deveres iguais, não seria agora que me posicionaria de forma diferente, mesmo se eu tivesse um parente juiz, isso jamais seria impedimento de defender algo do qual eu discordo..Sua compreensão pelo que escrevi, me fez bem.. Não serão palavras agressivas que me afastarão do JusBrasil.
abraços e Felicidades. continuar lendo

Realmente o assunto deve ser discutido! Concordo que não deva haver super cidadãos ou funcionários blindados contra as consequências de seus próprios atos. Que os empregados do Estado, que existe em função dos cidadãos e para os mesmos, recebam benefícios não disponíveis às demais pessoas e contrários aos interesses dos patrões (sociedade civil).

Ou seja, não é admissível que alguém com conduta anti social seja bancado pela sociedade civil (salário/aposentadoria vitalícia) e não seja punido (multa/prisão) quando atenta contra a mesma.

Porém a discussão deveria se afastar do cunho ideológico, que no texto está demonstrado por termos ligados a: patrimonialismo e igualdade material (renda). continuar lendo

Bom dia, Achilles. Bons argumentos. continuar lendo

E depois aparecem alguns defensores deste monte de irresponsáveis que deveriam dar exemplo de JUSTIÇA, e defendem também com unhas e dentes que não deve haver INTERVENÇÃO MILITAR.
TEM QUE HAVER SIM !
Só assim acaba esta pouca vergonha.
Que venham de novo os militares !
Mas que venham com senso de JUSTIÇA !
Nada de matança desenfreada.
Tem que meter na cadeia todos que com seus atos insanos geram a miséria absoluta que foi vista na televisão na reportagem do último final de semana onde COINCIDENTEMENTE no Maranhão observa-se as 4 cidades mais miseráveis deste imenso Brasil.
CADEIA EM TODOS que fazem os miseráveis morrerem de fome.
Não tem nada de Diretas Já !
O que tem que haver é...
MILITARES JÁ ! continuar lendo

Quando policiais civil, federal, militar, advogados, agentes penitenciários, guardas municipais, neste destacamos o caso da agente de trânsito, cujo final do túnel se esperava uma luz , ofuscante para este togado , parte da banda podre do judiciário com a "punição" da aposentadoria compulsória, infelizmente nem isto vimos do CNJ, dentre outros agentes públicos que se porventura cometerem uma infração por menor que seja, são punidos pelas excelências do judiciário, com a conivência do ministério público, com aumento da penalidade sob o argumento que deveriam dar o exemplo e são pagos pela sociedade para tal. Contudo, não há como entender a impunidade para um servidor como qualquer um outro, apesar de muitos se sentirem deuses, como se a toga fosse asas do arcanjo Miguel, ao fazer uso destas "asas" como anjos caídos para pintar o SETE nos mais diversos descalabros outrora inimaginável para esta classe de homens inflados por uma toga preta e seu cordão escarlate, cujos desmandos acobertados pelas tetas da LOMAN , exceto a "punição" da compulsória com proventos proporcionais ao tempo da vida marginal escondida nesta toga, não podem ser presos preventivamente. Enfim, acho que é querer "demais", pois não vemos nem mesmos filhos dos mesmos a cumprirem pena nos presídios do sistema, verdadeiro campo de concentração nazista, sistema este sádico ao vermos de agentes a delegados das polícias civil, federal, policiais militares de soldados a coronel, agentes penitenciários, advogados, este último onde não há hierarquia entre eles, juízes, promotores e demais membros do judiciário, serem colocados com seus desafetos num sistema penitenciário , onde as Excelências estão imunes. Concordo, portanto, com a desnecessidade de fundamentação nas decisões dos deuses, todavia que seja desnecessária a comunicação e/ou solicitação de investigação na vida de magistrados, promotores, procuradores estadual, federal para, comprovando uma vida indigna da toga, sejam presos preventivamente, com o agravante de não responderem em liberdade e, quando condenados terão sempre o cumprimento da pena em regime totalmente fechado sem progressão e outras benesses dos mortais. continuar lendo

"apesar de muitos se sentirem deuses, como se a toga fosse asas do arcanjo Miguel,"
Rapaz, que expressão feliz!
Só que a mão do cidadão nunca será mais pesada que a mão da lei.
A lei, sabemos, é a do mais forte, tanto na sua criação quanto na sua aplicação, com a caracteristica de jamais ser aplicada contra ele.
Esperar, portanto, que a sua aspiração, a qualquer tempo, seja acolhida chega a ser uma utopia. continuar lendo

Perdoem-me os colegas do fórum, pois não se pode generalizar. Contudo, boa parte dos advogados e serventuários da justiça tratam os juízes como seres divinos, o que provoca neles, os juízes, o sentimento de endeusamento. E quem se sente um deus, já deu um grande passo para a idiotice. E os idiotas são abusadores. É claro que os juízes devem ser tratados com certa deferência, dada a função, mas quem lida com a justiça sabe que a bajulação (e até o medo) de juízes é um realidade. continuar lendo